Os números do ENEM perpetuam o apartheid: dos 20 melhores colégios, 15 são particulares; o Colégio São Bento, do Rio, primeiro lugar pelo terceiro ano, cobra mensalidade de R$ 1.700,00 reais; 73% das escolas avaliadas ( maioria das redes estaduais) tiveram nota abaixo da média.
Parece que é nossa sina reproduzirmos nas diversas áreas da nossa história social o binômio “Casa Grande& Senzala”, consagrado por Gilberto Freire.Outrora, na distinção dos espaços ocupados por senhores e escravos; hoje, para assinalar as inaceitáveis desigualdades que se cristalizaram através dos séculos, mesmo que escravidão oficialmente não haja.
O que vemos, com os números acima expostos, é que a educação, instrumento por excelência de inclusão social, vem sendo, em nossa história perversa, exatamente o seu contrário: meio de exclusão, nicho de privilégios, campo sagrado de reprodução de um desequilíbrio absurdo de dois brasis que se afastam e se conhecem cada vez menos.
Na rede particular, escolas com estrutura invejável, turno integral de ensino, professores que dificilmente faltam às aulas, e, de resto, uma família com pais bem informados que investem incessantemente na formação dos filhos, com ensino complementar e, não raro, viagens ao exterior.
Na rede pública estadual, escolas em condições físicas precárias, professores que fazem da ausência uma regra, e muitas, muitas matérias que sequer têm professor para ensiná-las.Ademais, os pais, com formação inferior à dos filhos pouco podem fazer para ajudá-los e se recolhem ao lugar das sombras de sua pouca instrução, resignados e ainda agradecidos pelo fato de os filhos terem uma escola aonde ir.
O ensino brasileiro é a grande bomba social do país, disse muito bem Gilberto Dimenstein.Esse talvez seja o maior desafio de qualquer governo que ouse desenhar futuros.No segundo grau, pessoas em formação de 15, 17, 20 anos sonham com universidade, trabalho, vida melhor para os seus e possibilidade de fazer deste mundo um lugar melhor para todos.
E ,todo ano, milhões desses jovens acordam no meio da “noite veloz” alarmados pelo despertador do real que lhes diz de modo insensível e seco: não existe futuro para você!.
É isso que nos dizem os números do Enem.
Não desconheço o supremo esforço que este governo têm feito no sentido da inclusão de milhares de jovens: Prouni, ações afirmativas, cotas para alunos da rede pública, cursos profissionalizantes inaugurados em grande escala.Mas o abismo é grande e a velocidade, nossa maior inimiga.
Se é pela educação- e somente por ela - que poderemos ostentar a medalha de “país de primeiro mundo”, então “cesse tudo que a musa antiga canta” e faça-se do ensino público de qualidade a prioridade “zero” deste país.
Do contrário, é entregar a um povo potencialmente capaz um caderno em branco, onde ele não saberá sequer registrar a história do seu próprio fracasso.
*Jorge Portugal
Educador, poeta e membro do Conselho Nacional de Política Cultural
RETIRADO DO SITE PATRIA LATINA: http://www.patrialatina.com.br/editorias.php?idprog=fa8dbbcb682699544e4e8f2212115f73&cod=4071
Nenhum comentário:
Postar um comentário