Carta à mãe, sobre um equívoco da educação libertadora nos slides.

É com imensa felicidade que recebo as apresentações (slides) sempre reflexivos de minha querida mãe Vera Lúcia. Como sempre visualizo, tento aprender e me posicionar frente a eles. Às vezes, respondo pessoalmente, mas desta vez resolvi tornar público a resposta pelos motivos abaixo.

A primeira parte da apresentação é muito feliz com a linda história entre o avô (educador no sentido amplo da palavra) e o neto (que na situação é o educando). Mas o que me fez escrever e chamou a atenção foi o tratamento dos slides com a “educação libertadora”, colocando-a como responsável pelo fim dos professores (as) junto aos políticos e milicos. Isto é um equívoco que dentro de uma apresentação importante e brilhante (no primeiro momento) pode passar despercebido.

Outro ponto importante de ser ressaltado é que a apresentação quando faz a avaliação da educação libertadora entra em contradição/se mostra ingênua, pois a educação libertadora teve e tem como objetivo principal apresentar a educação como um ato político. Ou seja, a apresentação que critica a política dos políticos não consegue compreender que será através de uma educação política que professores e professoras se tornarão novamente importantes indivíduos para construção de uma sociedade justa.

Assim, um dos grandes pensadores da educação libertadora, Paulo Freire, nunca pensou no fim dos professores (as), principalmente no momento histórico em que vivemos vide o livro “Professora sim, Tia não”. Supor, devido a ficção da apresentação, que uma proposta de educação revolucionária foi responsável pelo fim dos educadores (as), parece-me uma divergência ideológica com a proposta.

Outra vez, a apresentação não consegue observar que aprovação direta é um interesse de uma política neoliberal nos países periféricos como uma das maneiras de justificar os empréstimos solicitados em órgãos suspeitos e não da educação libertadora.

Não quero colocar a educação libertadora num altar e dizer que ela é a solução para os problemas educacionais no Brasil de hoje, entendo que esta corrente da pedagogia trouxe muitas possibilidades de trabalhar na sala de aula e refletir sobre a prática do magistério.

Finalizando, duas perguntas: ninguém entende a educação libertadora ou algumas pessoas fingem não querer entender? Como os milicos não iriam existir numa sociedade que não terá professores (as)?

Agradeço a minha mãe que proporcionou uma reflexão a respeito da educação libertadora que tanto me inspira na caminhada do magistério.

Para visualizar a apresentação: Fim dos Professores

Gustavo Ferreira de Azevedo.
Geógrafo e educador
email: gustavo.fdeazevedo@gmail.com

2 comentários:

Anônimo disse...

Tema polêmico... E difícil de se tomar uma posição definida e clara à respeito dele sem correr o risco de pisar em ovos. Se "educação" é um termo tão amplo, polissêmico, a ponto de exigir de quem o emprega um esclarecimento do sentido, do significado e do contexto com os quais se utiliza a expressão, o que dirá a palavra "libertadora", já que a "liberdade" também tem muito a ver com a perspectiva e a visão de mundo de quem brada em nome dela. De categorias de pensamento, "educação" e "liberdade" foram convertidas naquilo que venho chamando ultimamente de "conceitos-Bombril", isto é, termos que têm mil e uma utilidades, já que se prestam a uma infinidade de discursos e projetos. Por exemplo, tanto os ultra-liberais quanto os anarquistas reivindicam para si o rótulo "libertário" e a gente sabe muito bem que o significado de liberdade para cada um desses grupos é diferente (embora ambos estejam de acordo que o Estado é uma força coercitiva e perniciosa). O que a história nos mostra, com fartos exemplos, é que em nome da libertação muitas sociedades viram a substituição de uma forma de dominação por outra. Bom, mas isso é uma coisa... outra é: uma educação libertadora, digamos, nos moldes paulofreireanos ("marxista", portanto), romperia com o sistema escolar regular ou deveria ser praticada e desenvolvida dentro dele? Não sou pedagogo, nem acompanho tão de perto os debates e as discussões em torno da questão, mas no caso da segunda opção isto não seria, ao contrário ratificar ou legitimar o sistema escolar burguês (que é esse que nós temos até hoje)? Porque não sei até que ponto uma educação libertadora nessa linha alcançaria os objetivos pretendidos dentro do sistema escolar como nós o conhecemos. Para mim a maior de todas as contradições é essa: a educação libertária torna-se-ia um projeto irrealizável no âmbito de uma sociedade que canoniza o sistema escolar (os próprios educadores paulofreireanos, de um modo geral, caem nessa armadilha). Eis o motivo pelo qual tenho sentido uma enorme simpatia por um livro escrito por um padre anarquista chamado Ivan Illich, "Sociedade Desescolarizada", no qual ataca a escola contundentemente, já que tanto para a direita quanto para a esquerda o sistema escolar seria uma "velha e gorda vaca sagrada" (sic). Não vi os slides da apresentação, logo teci meus comentários apenas baseado na imprecisão conceitual da expressão "educação libertadora" e no pouco que conheço do discurso dos educadores. Não sou totalmente contrário a escola, mas também sou radicalmente avesso à sua exagerada canonização, tanto pela direita quanto pela esquerda.

Anônimo disse...

Ah, o mesmo vale também para a "canonização do professor"! Rsrsrs